Uma das
concepções filosóficas mais importantes do budismo deriva daquilo que é
conhecido como a teoria da vacuidade. Em seu coração está o profundo
reconhecimento de que existe uma disparidade
entre como as coisas realmente são, do modo como as percebemos, inclusive a
nossa existência dentro dele. Na nossa experiência do dia-a-dia, tendemos a
nos relacionar com o mundo e conosco mesmos como se essas entidades possuíssem uma
realidade autocontida, definível, discreta (isto é, individualmente distinta,
isolada) e duradoura. Por exemplo, se examinarmos nosso conceito de eu,
descobriremos que tendemos a acreditar na presença de um núcleo essencial da
nossa existência, que caracteriza nossa individualidade e identidade como um
ego discreto (individualmente distinto), independente dos elementos físicos e
mentais que formam a nossa existência. A filosofia da vacuidade revela que isto
não apenas constitui um erro fundamental, mas é também a base para o apego,
fixação e desenvolvimento dos nossos inúmeros preconceitos.
De acordo
com a teoria da vacuidade, qualquer crença numa realidade objetiva,
fundamentada na pressuposição de existência intrínseca independente, é
indefensável. Todas as coisas e eventos sejam conceitos materiais, mentais, ou
mesmo abstratos como o tempo, são destituídos de existência independente. Tal existência
independente, intrínseca, implicaria que as coisas e os eventos são de alguma
forma completos em si próprios e, portanto, estão inteiramente autocontidos.
Isto significaria
que nada tem a capacidade de interagir com e exercer influencia sobre os outros
fenômenos. Mas sabemos que existe causa e efeito – gire uma chave de partida,
os plugues de faíca se inflamam, o motor liga e a gasolina e o óleo são
queimados. Num universo de coisas autocontidas inerentemente existentes, estes
eventos nunca ocorreriam. Eu não poderia escrever no papel e o leitor não seria
capaz de ler as palavras nesta pagina. Portanto, já que interagimos e fazemos
trocas recíprocas, devemos supor que não somos independentes, embora possamos
sentir ou intuir que sim.
DALAI LAMA
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