segunda-feira, 25 de abril de 2011

Entrevista com Marcelo Gleiser


Publicado em 16 de abril de 2011 por ERA
ERA:  O senhor afirma que “a escuridão parece igual a ignorância do homem, nunca vai se conhecer tudo sobre o mundo!”. Então o que se pode conhecer?
Gleiser: Não sabemos se existem limites absolutos ao conhecimento, embora tenhamos já encontrados dois deles: em mecânica quântica, que estuda os átomos e partículas subatômicas, existe o princípio de incerteza, que mostra ser impossível conhecer a posição e a velocidade de objetos pequenos com infinita precisão. Temos aqui um limite fundamental do que podemos saber sobre o mundo. Até hoje, ninguém conseguiu removê-lo. Na matemática, os teoremas da incompletude de Gödel mostram que mesmo lá a lógica não é auto-determinante; certas coisas não podem ser explicadas a priori. Mais pragmaticamente, como expliquei no meu livro Criação Imperfeita, o que sabemos do mundo depende essencialmente de nossos instrumentos de medida; e como estes têm limites de precisão, não podemos “ver” além do que eles nos permitem. Desta forma, existe sim um mundo invisível, ainda não detectado pelos nossos instrumentos. Nossa visão de mundo avança à medida em que esses instrumentos avançam, mas é sempre limitada por eles.
ERA: O senhor faz referência a uma ‘nova espiritualidade relacionada ao planeta”. Podemos com isso esperar o desenvolvimento de ‘nova moral’?
Gleiser: Espero que sim; quando compreendemos a fragilidade da vida, a hostilidade do universo à ela, necessariamente olhamos para o nosso planeta com novos olhos. Imediatamente, percebemos a necessidade de preservar o que temos aqui. Evoluímos juntamente com a Terra, e estamos profundamente vinculados a ela. Se destruirmos nossa casa, não teremos outra opção. Dessa forma, a nova moral se torna global, definindo um novo modo de encarar a vida e nossa missão aqui.
ERA: O senhor poderia explicar a sua frase: nós somos a consciência do Cosmos?
Gleiser: Dado que a vida no universo é rara (vide nossos vizinhos no sistema solar) e que a vida inteligente será muito mais rara ainda, até que encontremos uma outra inteligência em algum canto da galáxia, somos nós a única espécie inteligente que conhecemos. Mesmo que outras possam existir (ainda não sabemos nada sobre isso), estamos isolados aqui numa espécie de solidão cósmica. Como somos o único agregado de matéria capaz de refletir sobre sua existência, somos também como o cosmo reflete sobre si mesmo, ao menos num enorme volume de espaço. Isso nos dá uma nova forma de contemplar a dimensão humana, bem mais importante do que apenas mais uma forma de vida.
ERA: Como o senhor enxerga os problemas éticos gerados pelo desenvolvimento tecnológico?
Gleiser: A tecnologia é fruto da pesquisa e pode ser usada para aliviar o sofrimento humano ou para piorá-lo. Os problemas éticos dos usos de novas tecnologias são essencialmente políticos; o que definimos como “bem” ou “mal” varia com o poder, como sabemos da história negra do século XX. Contudo, dentro dessa divisão de quem somos nós no cosmo que estou propondo, tenho a esperança de que um novo despertar está para ocorrer, uma era em que atingiremos um nível ético mais sofisticado, quando nos tornamos guardiões da vida e não seus destruidores. Uma nova era inspirada pela ciência.
ERA: Na sua opinião o Relativismo e o Utilitarismo podem ser fatores ‘colapsantes’ da sociedade como entendemos hoje?
Gleiser:  Acho que os “ismos” são todos sujeitos de análise. Na minha visão, o que pode colapsar o mundo a médio prazo é a insistência em ignorar os danos que estamos causando ao meio ambiente. A terra é um sistema finito, que não comporta o nível de uso e devastação causados por 7 bilhões de pessoas. O que pode colapsar a sociedade é a combinação de ganância corporativa, por um lado, e de fundamentalismo, por outro. Ambos negam os avanços e descobertas da ciência.

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