terça-feira, 29 de março de 2011

começando a ler : A DANÇA DO UNIVERSO Dos mitos de Criação ao Big Bang

PREFÁCIO

Dos cantos de rituais ancestrais até as equações matemáticas que descrevem flutuações energéticas primordiais, a humanidade sempre procurou modos de expressar seu fascínio pelo mistério da Criação. De fato, todas as culturas de que temos registro, passadas e presentes, tentaram de alguma forma entender não só nossas origens, mas também a origem do mundo onde vivemos. Dos mitos de criação do mundo de culturas pré-científicas às teorias cosmológicas modernas, a questão de por que existe algo ao invés de nada, ou, em outras palavras, “por que o mundo?”, inspirou e inspira tanto o religioso como o ateu.
Ao retraçarmos os passos desse vasto projeto, exploraremos os vários meios com que a imaginação humana confrontou e continua a confrontar o mistério da criação; belas metáforas e um riquíssimo simbolismo cruzam as fronteiras entre ciência e religião, expressando uma profunda universalidade do pensamento humano. Entretanto, veremos que essa mesma universalidade demonstra a existência de certas limitações em nossa imaginação. O problema é que tanto nossa percepção sensorial como os processos de pensamento que usamos para organizar o mundo à nossa volta são restringidos por uma visão polarizada da realidade, que se baseia em opostos como dia-noite, frio-quente,
macho-fêmea etc. Devido a essas limitações, podemos oferecer apenas um pequeno número de argumentos lógicos que visam dar sentido àquilo que transcende essa polarização, o Absoluto de onde tudo se origina, seja ele Deus, um mítico “ovo cósmico” ou as leis da física.
Embora ciência e religião abordem a questão da origem do Universo com enfoques e linguagens que têm pouco em comum, certas idéias forçosamente reaparecem, mesmo que vestidas em roupas diferentes. Portanto, este livro começa com uma análise dos mitos de criação de várias culturas, e termina com uma discussão paralela de idéias científicas modernas sobre a origem do Universo. Ao apresentar uma classificação geral de mitos de criação e de teorias cosmológicas baseada em como essa questão é abordada por ambos, espero esclarecer tanto as semelhanças como as diferenças entre o enfoque religioso e o científico.
Neste estudo dos mitos de criação e da cosmologia moderna, examinaremos de que forma a nossa compreensão da Natureza e do Universo como um todo desenvolveu-se de mãos dadas com a evolução da física, desde suas origens com os filósofos pré-socráticos da Grécia antiga, até a introdução da mecânica quântica e da teoria da relatividade durante as três primeiras décadas do século xx.
Este livro é também sobre as pessoas responsáveis pelo desenvolvimento da nossa visão do Universo, visão esta que está sempre em constante evolução. Não só explicarei as idéias desses vários indivíduos, mas também explorarei suas motivações, sucessos e lutas travadas no desenrolar desse longo drama. Como veremos, a religião teve (e tem!) um papel crucial no processo criativo de vários cientistas. Copérnico, o tímido cônego que pôs o Sol novamente no centro do cosmo, era mais um conservador do que um herói das novas idéias heliocêntricas. Kepler, que nos ensinou que os planetas se movem ao redor do Sol em órbitas elípticas, misturava, de forma única, misticismo e ciência. Galileu, o primeiro a apontar o telescópio para as estrelas, era um homem religioso (e muito ambicioso), que acreditava poder salvar sozi-
nho a Igreja católica de um embaraço futuro. O universo de Newton era infinito, a manifestação do poder infinito de Deus. Einstein escreveu que a devoção à ciência era a única atividade verdadeiramente religiosa nos tempos modernos.
Acredito que ao conhecer esses cientistas vamos entender melhor não só sua ciência, mas também os cientistas em geral; como eles pensam, sentem e que elementos subjetivos fazem parte de seu processo criativo. A noção, infelizmente bem generalizada, de que os cientistas são pessoas frias e insensíveis, um grupo de excêntricos que dedicam sua vida ao estudo de questões arcanas que ninguém pode entender, é profundamente equivocada. Como espero mostrar, a física é muito mais do que a mera resolução de equações e interpretação de dados. Até arrisco dizer que existe poesia na física, que a física é uma expressão profundamente humana da nossa reverência à beleza da Natureza. Física é, também, um processo de autodescoberta, de “pró-cura”, como me disse certa vez o psicanalista Hélio Pellegrino, que acontece quando tentamos transcender as limitações da vida diária através da contemplação de questões de natureza mais profunda. Espero que, após terminar este livro, você concorde comigo.
Este livro é para todo indivíduo, cientista ou não, que tenha curiosidade acerca do Universo em que vivemos. Embora aqui trate de ciência, história da ciência e da relação entre ciência e religião, este livro não é um tratado acadêmico sobre esses assuntos. A idéia aqui não é ser exaustivo ou muito detalhado, pois isso iria contrariar minhas intenções, transformando este livro em algo que não é. Dada a grande variedade de tópicos, vários detalhes foram postos de lado, intencionalmente ou não. Para os leitores que queiram mais informação, ofereço uma lista para leitura adicional na bibliografia.
Gosto de comparar o cientista que escreve sobre ciência para o público em geral com um tradutor tentando encontrar modos para descrever certas imagens e idéias em uma nova língua que talvez não seja tão adequada quanto a língua original, no caso a matemática. Inevitavelmente, algo será sempre perdido na tradu-
ção, certas idéias e imagens terão seus significados obscurecidos ao serem expressas dentro de outra estrutura lingüística. Como solução, freqüentemente apelarei para sua imaginação, invocando imagens da vida diária que irão ajudar na elucidação de certos aspectos mais técnicos. Assim como em música não é necessário saber ler uma partitura para poder apreciar a beleza de uma sinfonia, em física tampouco se precisa saber resolver uma equação para apreciar a beleza de uma teoria. Minha esperança é que a tradução seja boa o suficiente para que você possa compartilhar da minha paixão pela ciência e por esse Universo que jamais deixará de nos surpreender e maravilhar.
MARCELO GLEISER

Ouvir

(Ouvir) uma ação que tenta compreender o outro (deveria ser).
Mas o que se faz na realidade, na maioria das vezes é: "como vou responder", "eu penso assim", "como vou reagir"...
Começa e termina sendo uma ação onde os pensamentos se desenrolam no limite de dentro da sua cabeça


Isto é, existe a [ ação de ouvir] , como uma ação que direciona a atenção e interesse no outro
mas que na realidade, o que se faz é direcionar a atenção nas coisas que surgem na sua própria mente, e a faz desenrolar em várias direções.


a ação de ouvir seria a ação de direcionar a atenção e interesse no outro.
mas na realidade
é um estado em que a atenção está voltado ao que acontece dentro da sua própria cabeça

Significa que a atenção está voltada em direção contrária

Pensa em ouvir o outro
mas o que faz é direcionar a atenção nas suas coisas

Um apego a coisas de si

Se alguém diz:
- "essa comida não é gostosa" - recebe como crítica a si
- "esse relatório está a desejar" - desculpe, não tive tempo..., tenta falar de si
- "não gostei disso" - é porque isso, aquilo..., tenta justificar

é claro que se deve falar o que quer falar ao outro
mas antes de mais nada, ouvir o que o outro quer dizer, compreender, e depois disso, se tiver algo que queira falar, falar...

Antes de ouvir o que o outro quer falar, de compreender o outro, estão as minhas idéias, se quero ou não quero fazer.... começa pensar nas suas coisas..... está apegado em sim

não ter atenção ao outro, na realidade, já é em si, um estado de apego ao "eu"

by M.O.

domingo, 27 de março de 2011

Onde as pausas são esclarecimentos


Alguém comentou comigo outro dia como é estranho trabalhar sem saber aonde se está indo. Essa é a prova de que estamos num processo que é experiência e conhecimento inesperado, que nos leva a interrogar e a interrogar-nos. É difícil trabalhar sem saber qual poderá ser a conclusão. Dá a impressão de vagar sem objetivo. Sabemos muito bem o quanto é importante o nó final, o ponto de chegada do processo. Mas este aparece como uma saída imprevista do labirinto que o processo de trabalho constituiu. Quando pensamos que nos aproximamos, nos distanciamos. Quando pensamos que estamos longe, a saída está perto.
O final é um nó no qual se reúnem todos os fios tecidos e entrelaçados durante o trabalho. Todos os fios encontram-se selando o “texto lógico-sensorial”. O verdadeiro final é o que encontra o seu inicio, uma experiência rara, na qual as oposições se abraçam e as polaridades parecem coexistir na mesma situação, em um único corpo, em uma única ação.
Tudo isso não pode ser projetado na mesa. Não acontece de maneira consciente e não é possível prepará-lo antecipadamente. É um presente, um momento de graça, que nos enche de gratidão, porque ignoramos o motivo pelo qual o merecemos.
Não existe descoberta se a rota já é fixada. Pode-se aprender a içar e a abaixar velas, a lutar contra as correntes, a usar os ventos contrários. Durante esses dias, falamos do aspecto artesanal do trabalho, o primeiro e o segundo nível de organização. Mas o terceiro nível, o da totalidade, das polaridades que coexistem , o da ação no contexto, o momento no qual o nosso temperamento e a nossa biografia nos guiam a constituir e a atravessar um labirinto, a entrelaçar os fios, a apertar o nó final, é o resultado de uma injustiça existencial. Alguns a alcançaram, outros não.
É possível atingir uma nova praia navegando sem uma rota claramente definida. Conhecemos apenas as técnicas para navegar. Não sabemos se atingiremos o continente sonhado. A consciência de nossos limites nos atormenta: talvez, dessa vez, não chegaremos. O fio de Ariadne é o trabalho cotidiano, a concentração sobre a aparente simplicidade de cada ação artesanal que nos guia na névoa que nos desorienta. Com a precisão essencial da ação que poderá ser a última.
Obviamente nenhum de nós deseja sofrer, expor-se à insegurança ou viver em estado de crise. Mas uma nova orientação só é possível como conseqüência de uma desorientação. Na nossa vida, uma crise pode ser uma pausa-transição, na qual a nossa experiência se prepara para saltar numa nova órbita, que revitaliza as nossas energias.
Estar desorientado significa que as soluções e respostas que possuíamos antes já não nos satisfazem. É o nascimento de algo novo, “nove meses” de gestação, com náuseas, o vomito, a sensação de que o corpo físico e psíquico está se deformando. Nesse periodo de desorientação, toda nossa experiência anterior trabalha para buscar um novo modo de manifestar-se, abandonando a casca segura dos hábitos que agora nos atrapalham.
Eugenio Barba.